ARCIL - Associação Para A Recuperação De Cidadãos Inadaptados Da Lousã

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45º ANIVERSÁRIO da ARCIL – por José Manuel Marques Leandro

45º ANIVERSÁRIO da ARCIL – por José Manuel Marques Leandro

2021-07-05 by arcil News, Notícias

José Manuel Marques Leandro iniciou as suas funções na ARCIL no ano de 1983, como 1º Secretário da Assembleia Geral, até 1985. No período de 1985 a 1997, ocupou o cargo de Presidente da Assembleia Geral passando a exercer no mandato seguinte, o cargo de Vice-Presidente da Direção da ARCIL, mantendo-se nesta função por 2 mandatos. Em dezembro de 2000, com a saída do então Presidente da Direção José Ernesto Carvalhinho, assumiu o cargo de Presidente da Direção da ARCIL, exercendo-o por 5 mandatos. Atualmente, Marques Leandro sai da presidência da Assembleia Geral, cargo que ocupou de 2014 até ao presente, deixando vincada a sua relevante passagem pela ARCIL.

Tendo como mote a celebração 45º Aniversário da ARCIL, convidámos J. M. Marques Leandro a prestar o seu testemunho sobre o vínculo com mais de 38 anos à ARCIL. No ano em que se despede do seu último mandato como Presidente da Assembleia Geral, presenteia-nos com um testemunho autêntico, recheado de memórias e muita emoção à mistura.

“A primeira “marca” para estas recordações é esta: eu e a Maria de Lourdes somos os pais do João Leandro. Este facto constitui farol importante das nossas vidas.

Regressados de África em 1975, reiniciando as nossas atividades profissionais, procuramos em Lisboa apoio especializado para o João. Nada que nos satisfizesse, principalmente à mãe, que era professora com curso do Instituto António Aurélio da Costa Ferreira. Contudo, estas formação e vocação permitiram reduzir as dificuldades do João e ajudaram a moldar o seu comportamento para viver em sociedade com simpatia e conseguir igual retribuição.

Em 1979, minha mãe e minhas irmãs, as três professoras, deram-nos a notícia que na Lousã tinha sido criada uma instituição que apoiava pessoas com deficiência, já com sucesso. Era conhecida como ARCIL. e o presidente da respetiva Direção era o seu colega Professor António Maio. Aconselhavam uma visita.

Marcámos e visitámos a ARCIL. Fomos recebidos pelo Professor António Maio e Luiz Torres. Historiaram a fundação da ARCIL, as fases já vencidas e depois visitámos as instalações e utentes, incluindo o Miguel e o Tó e também o Zé –

filhos respetivamente de António Maio e Luiz Torres –, e também fomos apresentados a alguns técnicos. Recordo que entre esses técnicos encontramos a Lígia Soares, assistente social ligada por laços próximos à família Leandro. Nesses momentos retivemos impressões muito favoráveis. Vivia-se na ARCIL em ambiente de tensão interna com pressões de grupos. Uns, conservadores na então política nacional de apoio à deficiência, principalmente classes especiais, outros mais audaciosos, defendendo doutrina de autonomia progressiva das pessoas a seu cargo, com base em projetos e experiências que conheciam. O Ministério da Educação tinha destacado vários professores dos seus quadros para a instituição.

A Maria de Lourdes, ficou encantada. Logo ficou assente que o nosso João se sentiria bem ali. E ali ficou. Residia em Rio de Vide, em casa de sua avó, minha mãe, com acompanhamento muito próximo de minha irmã Olga, ali professora. Uma carrinha da ARCIL fazia diariamente um percurso de recolha e regresso de utentes do Mosteiro de Semide, do João e outros. Nós continuávamos em Lisboa com importantes responsabilidades profissionais. Deslocávamo-nos de vez em quando para vermos o filho, visitarmos a ARCIL e avaliarmos progressos. Desses contactos, recordo a evolução da situação que se vivia na Instituição. Os defensores da evolução das doutrinas de gestão e de reabilitação foram ganhando terreno até rutura entre conservadores e progressistas. Tivemos pena que assim tivesse acontecido. Dessa fase recordo os fundadores da ARCIL que conhecemos. Havia uma situação que era comum a eles e a nós. Éramos pais de pessoas com deficiências, com angústias semelhantes. A ARCIL deve-se a eles. Em cada visita confrontávamo-nos com novos programas e novas soluções que apoiávamos. Por outro lado, apreciávamos as formas de intervenção com grande proximidade e carinho dos técnicos e cuidadores. 

Nos Codessais a ARCIL abriu um lar. O João passou a residente nos Codessais. A sua tia Olga ia buscá-lo para passar os fins de semana com a família. Visitei-o várias vezes e nesse período ganhei bons amigos que, com risco de não registar outros, relembro e mantenho contactos frequentes com o Galvão e com o António Vinagre. Mais tarde, o José Ernesto Carvalhinho, presidente da Direção, explicou-nos o novo programa para Emprego Protegido. Apoiámos a iniciativa e autorizámos que o João beneficiasse desse programa, sabendo nós que isso implicaria grande esforço dos trabalhadores protegidos. Esse esforço seria compensado pelo reforço da autonomia, da disciplina, da entreajuda com colegas e da promessa de uma pensão de reforma no futuro.

Foi criado na instituição o Centro de Emprego Protegido – CEP. O João passou a trabalhar na unidade de madeiras – serração. O encarregado era o Jorge Ferreira com quem estabelecemos sólida amizade que cultivamos. Trabalho duro, mas resultados muito positivos. João Graça, professor destacado do Ministério da Educação, acompanhava os trabalhadores na aquisição de saberes escolares. Depois passou a coordenar o CEP. Assistentes sociais resolviam problemas e educavam. Elisa primeiro e depois Luísa Barros, deixaram marcas nas personalidades e memórias de cada um.  Mais tarde, o João passou a trabalhar em outra unidade, a cerâmica, também com boa integração. Quando vinha de férias a Lisboa percorria sozinho áreas turísticas da cidade, visitava clientes que vendiam produtos de cerâmica da ARCIL e os vendedores ficavam encantados por contactarem um dos “artistas” que ajudava a confecionar as suas peças. Passou a ser conhecido e acarinhado por eles. O CEP passou a constituir um agrupamento mítico para os seus trabalhadores. Tinham contrato de trabalho, conta na Caixa Geral de Depósitos, orgulhosos do seu estatuto e cientes que participavam com as suas atividades para a sustentabilidade da Instituição. Rejeitavam atividades ocupacionais que funcionavam noutra unidade, o CAO (Centro de Atividades Ocupacionais). Eram CEP, a “elite da Casa”!

Embora continuando em Lisboa donde seria difícil mudar de vida, perante a confiança que na ARCIL me foi concedida, aceitei ser Presidente da Assembleia Geral, missão que facilmente poderia exercer mesmo à distância, deslocando-me à Lousã quando necessário ou ajudando a Direção a resolver problemas pendentes em serviços centrais.

O nosso farol, João, preocupava-nos. Faltava-nos a proximidade dos afetos. Logo que nos foi possível iniciámos a aproximação. A Maria de Lourdes foi colocada em escola de Miranda do Corvo. Eu vim para Coimbra, mandatado pelo Governo, para instalar o Centro de Estudos e Formação Autárquica – CEFA, dirigir o curso de administração autárquica e dar aulas. O João passou a viver connosco, sendo viajante conhecido na automotora.

Na ARCIL as atividades continuavam com o nosso apoio, mas recordo que me impressionava e me preocupava a organização interna, que considerava algo caótica, com grupos de solidariedades parecendo em autogestão, por vezes resistentes a intervenções de correção, com controlo interno deficitário e riscos que a minha formação e longa atividade profissional na Administração Pública não consentia e os valores de ética como funcionário público e cidadão me impunham.

Em 1995 os riscos potenciais explodiram. Foi detetado um desfalque de tesouraria de muitos milhares de contos. José Albano Metelo Nunes dos Reis foi o autor, fugindo para parte desconhecida, aproveitando falhas de controlo interno. Esta situação foi amplamente noticiada, discutida, analisada, reprovada pela comunidade que especulou sobre responsabilidades. José Metelo foi julgado à revelia nos tribunais e condenado, deixando sua família em situação muito difícil. A confiança da comunidade e dos serviços governamentais de apoio ficou afetada. Nas medidas tomadas para restaurar a confiança aceitei a missão de Vice-Presidente da Direção presidida, em continuidade, por José Ernesto Carvalhinho de Paiva.

Nesse mandato discutiu-se muito o modelo de gestão da ARCIL. Recordo a ação excelente, entre outros, de Luiz Fontinha e Carlos Carvalho, empresários e gestores, pessoas bem conhecidas na Lousã. Luiz Fontinha era pai do Paulo Fontinha, internado no lar da ARCIL localizado na Santa Casa da Misericórdia. O Paulo Fontinha era portador de deficiência profunda, acarinhado por sua família e seus cuidadores, acompanhava seus pais de férias. Raramente correspondia às tentativas de outras pessoas para lhe cativar atenção. Eu também o visitava com frequência e, com apreço meu, ele permitia a troca de atitudes carinhosas. Um dia faleceu perante situação dramática que suas cuidadoras não puderam evitar.

As abordagens passavam por modelos diferentes. Uns por modelo em que a Direção poderia seria constituída maioritariamente por pessoas da comunidade, de preferência pais de utentes da ARCIL, por funcionários dos quadros do Estado destacados na ARCIL e por trabalhadores da ARCIL. Outros, em que a Direção seria constituída por pessoas sem vínculo laboral com a ARCIL e com Serviços dela dependentes, admitindo-se que aquela pudesse delegar algumas competências nestes. Provavelmente outras variantes. Abordagens interessantes. Consultores contratados fizeram audições com larga participação de dirigentes e trabalhadores que permitiram avaliar a visão de gestão dos participantes, consolidar a opinião de alguns e alterar a opinião de outros.

Este mandato foi prejudicado por doença súbita do Carvalhinho. Foi grande a consternação e preocupação na ARCIL. Mais preocupado fiquei quando o visitei na companhia da Cristina Silva, minha competente colaboradora, na sua residência. Encontramos o Carvalhinho tentando recuperar do episódio de saúde que o fizera evacuar de urgência para Coimbra. Infelizmente o seu estado de saúde e anímico levaram o Carvalhinho a interromper a presidência da Direção. Pessoas amigas, convenceram-me a aceitar ser o novo presidente da Direção. A minha qualidade de pai e o facto de ter “bebido água da mina” como dizia Aristides Adão, não admitia outra decisão. Seguiram-se vários mandatos em que continuei a presidir à Direção.

Gostaria de deixar aqui os nomes dos meus companheiros de Direção. Se o fizesse cometeria erro de omissão de alguns. Quem os quiser conhecer recorra à lista de dirigentes e datas em que participaram. É que a minha memória não esquece bons amigos, leais e competentes gestores da Instituição. Todos eles sem remuneração nem utilização privativa de bens do património da ARCIL.  São meus amigos. Permitam-me, contudo, deixar aqui um testemunho especial de agradecimento. Trata-se de João Pereira, pai do João, utente da ARCIL, autista. Sempre presente, repartindo a sua colaboração atenta e competente com a Presidência da Junta de Freguesia de Serpins que muito lhe deve. Sua esposa, mãe do João, Senhora Eugénia Sêco Pereira, tinha sido gestora dos transportes da EDP. O serviço de transportes na ARCIL era para nós um constante quebra-cabeças. A insuficiência de unidades, a gestão dos motoristas, os circuitos programados cada vez mais longos, os transportes ocasionais, a manutenção preventiva e corretiva, o consumo de combustíveis, sobresselentes e outros, excediam a nossa capacidade de correta gestão. O meu amigo e companheiro, Vice-Presidente, Dagoberto Marujo, aposentado como quadro superior da EDP, falava-me que quem sabia bem por experiência sábia dessa atividade seria a Senhora Eugénia Pereira. O convite não foi feito. Acho que bastou a senhora conhecer as nossas dificuldades. A partir daí assumiu a responsabilidade de gerir os transportes. Todos os dias se apresentava e trabalhava na ARCIL como voluntária, até ao último ano (2020). Dedicação que merece registo.

Recordo a grave crise económica entre 2008 e 2014 que originou o colapso das finanças públicas e privadas e o aumento do desemprego. Isto aconteceu quando na ARCIL tinha sido aprovado plano para fortalecer a capacidade financeira e organizacional da ARCIL. Previa-se a transferência de unidades de produção, a serração e outras, para a zona Industrial da Lousã em terrenos cedidos pela Câmara Municipal. Os terrenos libertados na Vila seriam vendidos a potenciais compradores e investidores em época em que os empreendedores os procuravam. Havia interessados. Esse plano foi designado SUSTENTO. O autor deste plano foi Paulo Pinho, então gestor na ARCIL. O BPI abriu concurso para projetos a apresentar por entidades dedicadas a obras sociais com um prémio de 250.000€. A ARCIL ganhou o concurso com menção honrosa em cerimónia de entrega em Belém, Lisboa. Infelizmente a tal crise económica caiu em cima do sonho. Os empreendedores esperados perderam interesse. O BPI, contudo, reconhecendo a qualidade do projeto SUSTENTO e apreciando a Instituição, compensou com um donativo de 70.000€. Nessa fase tivemos a sorte da orgânica do Governo incluir a Secretaria de Estado para a Reabilitação sendo Secretária de Estado Adjunta, Idália Serrão. Ela apresentou o seu programa em diversos pontos do País. Ao apresentá-lo em Coimbra, o que não era vulgar, a ARCIL foi ali representada por mim, por Cristina Silva e Emília Lopes.  Fiquei favoravelmente impressionado por vários motivos. O Plano listava um elevado número de programas a implementar. Nele identificámos programas cujo conjunto abrangia todas as necessidades que as instituições ali representadas gostariam de ver implementadas. A minha primeira avaliação foi por isso muito positiva, porque esse método não era muito vulgar no nível político. Apreciei também a coragem da governante sabendo-se que os planos propostos nesse nível constituem compromisso político. Faltava nele, sim, informação sobre prioridades. Ficamos disponíveis para ajudar. E assim fizemos.

A ARCIL beneficiou da visão de Idália Serrão e do facto da Secretária de Estado depender diretamente do 1º Ministro, o que ajudava a ultrapassar dificuldades surgidas nos Ministérios. A ela recorremos várias vezes nesse sentido. Recorremos também para implementarmos vários projetos. Recordo um deles que atingiu um valor e notoriedade que podemos assinalar como êxito extraordinário. Refiro-me ao Festival Internacional da Canção de Pessoas Com Deficiência. A candidatura foi preparada pela Ana Araújo e Rui Ramos. Acompanharam os nossos intérpretes à Holanda. No dia do espetáculo recebi um telefonema da Ana Araújo e do Rui Ramos que me gritavam entusiasmados: “GANHÁMOS!”. Repeti o grito para quem me ouvia. No ano seguinte foi a ARCIL a realizar o Festival Internacional. Realizou-se na Figueira da Foz. Foi um êxito. A Secretária de Estado deu uma ajuda inestimável e partilhou o êxito. Também foi a Secretária de Estado que inaugurou um ótimo equipamento para nele instalarmos atividades importantes, o Centro de Atividades Ocupacionais, segundo projeto arquitetónico muito cuidado e equipamentos com tecnologias de ponta. Assinalo aqui adesão da comunidade Lousanense. Entidades, empresas, famílias e cidadãos mandaram fabricar na Cerâmica da ARCIL placas e azulejos com suas decorações e mensagens para testemunho de donativos financeiros que entregaram á Instituição. Decoram uma das paredes exteriores para que conste.

A propósito desta solidariedade Lousanense, recordo alguns factos importantes.

O primeiro refere-se ao acompanhamento interessado da Câmara Municipal. Conheci e apreciei sempre as atividades dos Presidentes e das Vereações. Fernando Carvalho, apoiou e ajudou a concretizar projetos muito importantes, entre os quais o projeto das acessibilidades a pessoas com dificuldades. Ernesto Carvalhinho foi o impulsionador. Os serviços públicos, as empresas, as moradias assinaladas e outros equipamentos adotaram soluções de acesso a cadeiras de rodas, carros de bebés e outras situações que facilitaram a circulação de pessoas. A urbanização foi adaptada a essa finalidade. A Lousã passou a ser conhecida como modelo de acessibilidade. Luís Antunes está sempre presente. Um dia, em proximidade de eleições autárquicas às quais Luís Antunes se apresentaria novamente como candidato à presidência, contactou-me para me colocar uma questão importante. Quis saber a minha opinião sobre o gosto que teria em incluir na sua lista Ana Araújo, responsável por programas importantes na ARCIL. Eu disse-lhe que também gostaria muito que Ana Araújo fosse Vereadora da Câmara na área social por dois motivos: Primeiro porque aprecio o interesse de pessoas quando resolvem intervir como cidadãos responsáveis nas oportunidades oferecidas pela democracia; Segundo porque, conhecendo bem a capacidade de trabalho, o interesse que sempre demonstrou, a sua personalidade e bom senso, a prática intensa em atividades sociais que todos reconheciam, eu felicitei o então candidato pela escolha. Ele fez o convite, mas Ana Araújo só aceitou com a condição de manter as suas responsabilidades na ARCIL. Chegámos a um entendimento. O mandato municipal seria exercido pela Vereadora a meio tempo. O mandato foi exercido com agrado de todos. Confrontou-se com situações que até aí não conhecia. Teve que enfrentar e cuidar dos vários tipos de preocupações no exercício das suas funções. Tinha que pesar o que declarava, propunha ou executava, tendo em consideração a oposição política formalizada nos órgãos autárquicos, na comunicação social e nas limitações impostas pelas leis que obrigavam a adoção de procedimentos muito complexos. No seu regresso à ARCIL foi elemento importante para ajudar a implementar medidas de gestão.

A ARCIL era conhecida e acarinhada pela comunidade da Lousã. Isso é muito evidente ao conviver todos os dias com os nossos utentes que circulam pela vila, frequentam cafés, espetáculos, sob uma vigilância discreta de seus cuidadores. Nunca houve incidentes desagradaveis nessa convivência. Penso que a maior evidência dos sentimentos de apreço e carinho dos lousanenses repetia-se todos os anos nas festas de S. João, no desfile das Marchas Populares.

Várias instituições, freguesias, bairros, preparavam em segredo as suas marchas representativas. A ARCIL participou sempre com a sua Marcha. Escolhia sempre um tema de interesse global, não se limitava a demonstrações de folclore. Por isso os lousanenses e não só, durante os desfiles das representações, aguardavam a Marcha da ARCIL com interesse e carinho.

A ARCIL, representada sempre por seus utentes, enquadrados por seus cuidadores, com uma banda na qual participavam alguns músicos que foram alunos de Rui Ramos na Escola Superior de Educação e que se deslocavam das suas moradas longínquas para participarem no evento anual sem remunerações. Relembro a Marcha da ARCIL no ano em que se celebrava em todo o País o 35º aniversário da Revolução de 25 de Abril de 1974. O Alcindo Quaresma, professor de ginástica, e não só, rodeado de colaboradores de todas as especialidades, desenhava e ensaiava coreografias com orientação musical de Rui Ramos e apoios de material inventado na casa. Havia e há colaboradores que sempre funcionaram como o sal e a cebola na cozinha, entram em todos os cozinhados. Alguns deles muito antigos na casa, como Luís Tomás, Ulisses Martins, Zé Gaspar, e outros. Nesse ano o tema foi a Revolução de Abril. A ordem da participação das representações era feita por sorteio na Câmara Municipal. A ARCIL desfilaria nesse ano quase no final e isso foi bom, porque as centenas de espectadores que se colocavam em filas compactas ao longo do percurso, aguardaram com curiosidade a sua prestação. A representação da ARCIL relembrava o 25 de Abril. Quando iniciou o seu desfile foi saudada com surpresa e emoção por quem a aguardava. À frente desfilavam os nossos utentes com fardas simulando militares com G3 de madeira, em marcha e coreografia adaptadas. Na retaguarda aparecia uma autometralhadora simulando a Chaimite utilizada na Revolução, fabricada com base em carrinha envolvida em “blindagem” de madeira e pintura adequada. Toda esta Força era comandada pelo Alcindo com farda, galões e atitude copiadas do Capitão Salgueiro Maia que prendeu Marcelo Caetano no Quartel do Carmo. A Força arrancou com a música “Grândola Vila Morena”. A música era seguida da transmissão de gravação autêntica do Manifesto do Movimento das Forças Armadas. Os participantes desfilavam cantando,

Uma gaivota voava, voava,

Asas do vento, coração do mar

Como ela somos livres, somos livres,

De voar…

Então assistimos e participámos emocionados nos aplausos e emoções de centenas de pessoas que também cantavam a Vila Morena e Uma gaivota.

A Lénia Quaresma conseguia a participação de autistas que dançavam talvez noutro mundo! Eu penso que dançavam em nuvens de felicidade.

Os nossos militares também se sentiram livres para voar! Marcharam com destino à sua base passando pela Travessa onde muitas pessoas festejavam o S. João com sardinhas assadas. Quando a tropa entrou na Travessa abriram alas e foi outro delírio. Falei com o oficial comandante da GNR, que ali estava com sua família, dizendo-lhe: saiba que ouvi pessoas a pedir que esta Força se dirigisse ao quartel da GNR. Não consenti. Originaria confusão, o piquete de serviço fecharia portões, pediria reforços e o meu amigo não estaria aqui a comer sardinhas. Teria que dar autorização para o comandante da força sitiante entrar no quartel para prender o Marcelo Caetano. Ficaria completo o espetáculo.

O capitão Alcindo e a motorista da Chaimite, Rita Dias, irmanados naquela guerra e noutras guerras, casaram e são felizes com sua filhinha Maria Jasmim.

No salão nobre da sede, sala Jorge Carvalho, prestou-se homenagem aos fundadores da ARCIL. Os que assinaram a escritura são ali permanentemente recordados pelas suas fotografias. Também ali está homenageado Jorge Carvalho, que fez a doação da quinta sede para instalação da Instituição.

Entretanto, as preocupações com a organização interna foram evoluindo até se fixarem no Estatuto que foi aprovado em Assembleia Geral de 14 de novembro de 2015.

Nos Estatutos foi fixado que seria necessário ficar bem frisado que nem os corpos gerentes, nem os serviços são donos da ARCIL. Trabalham em nome da comunidade que representam, com os objetivos fixados e sob sistema de controlo interno e externo definidos. A estrutura dos serviços dependentes da Direção passou a integrar o Conselho de Gestão, o Departamento de Reabilitação dirigido pela Diretora Executiva Cristina Silva e o Departamento de Gestão, dirigido pelo Diretor Executivo Luís Lopes correspondendo à estrutura já implantada anteriormente em regime experimental que clarificou e facilitou as atividades. A Direção delega, sempre que possível e necessário, alguns dos seus poderes nos Serviços. Isso permitiu acolher na Direção pessoas que exercem as suas atividades no exterior sem as obrigar a permanência constante nas instalações. É com muito gosto meu, que isso acontece. A execução de programas e projetos é, praticamente na totalidade, executada por profissionais sob supervisão da Direção.

Também foi muito importante a adoção da Política de Qualidade, aplicada nas ações de planeamento, conceção, organização, desenvolvimento e avaliação de todas as atividades. Leia-se, por exemplo, o Relatório de Atividades de 2019 aprovado, para se perceber o grau de qualidade e rigor de informação em todos os setores.

A determinada altura de crise não só financeira, mas na minha opinião, também de errada visão de intervenção social do Governo e do IEFP, foi posto em causa o Centro de Emprego Protegido. Exigiu-se à ARCIL a redução do CEP. Perante essa exigência contestada pelos pais, achámos que deveríamos dar exemplo, para encerrar a discussão e eliminar o risco de ficarmos sem a totalidade do CEP. O nosso João deixou de ser CEP. Foi aposentado. Isso teve reflexos negativos na vida do João e na nossa.

Iniciámos diligências para alterações. O nosso farol apontava outro rumo.

Rui Ramos, que tinha dado à ARCIL colaboração inestimável ao longo de muitos anos foi meu colega de Direção e evidenciou grande competência na gestão de situações difíceis. Foi eleito Presidente da Direção e eu Presidente da Assembleia Geral. Exerceu a sua responsabilidade como eu esperava. Tendo optado por consolidar a sua atividade profissional como professor, optou por um contrato de trabalho em escola localizada em Luanda. Eu e a Lourdes fomos despedir-nos do Rui Ramos ao aeroporto de Lisboa. Despedimo-nos com emoção. Nelson Tiago assumiu a presidência da Direção com o meu aplauso. Perante os projetos que estão em curso e a expectativa de grande melhoria de condições de desenvolvimento, candidata-se agora a novo mandato, também com meu aplauso. Rui Ramos, regressado de Angola, candidata-se a Presidente da Assembleia Geral. É justo e necessário.

Este texto já vai longo. Permitam-me registar que a Ana Bandeira foi assistente da Direção muitos anos. Não esqueço a sua competência, bom senso, simpatia que gerou grande amizade e consideração extensiva a nossas famílias. Continua a colaborar na ARCIL. Ela e Maria José Malta estiveram comigo na Mesa da Assembleia Geral e Rui Ramos conta com elas. Boa escolha, Rui.

Trouxe da Lousã gratas recordações. Entre outros, dois significativos testemunhos de apreço. Um, o Diploma e Medalha de Cidadão de Mérito que a Câmara Municipal me conferiu. Outro, a nomeação de Cidadão de Mérito gravada em placa de prata, concedida pelo Rugby Club da Lousã.

Continua comigo a ARCIL, SEMPRE! “

José Manuel Marques Leandro
Maio de 2021.

Fotografia: Arquivo – Abril de 2017
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